Entre setembro e outubro do ano passado, encarei a missão de tentar passar 50 dias sem mentir. A experiência rendeu uma reportagem que saiu na SUPER há dois meses (clique para ler). No final da matéria, havia um desafio aos leitores. Pedimos que tentassem passar um tempo vivendo a honestidade radical, teoria do psicoterapeuta americano Brad Blanton que serviu de base para o texto.
Bem, já passou um tempo e eu fiquei devendo um retorno aos leitores que se dispuseram a compartilhar conosco suas experiências. Demorei porque tirei férias e, em seguida, vieram as festas de fim de ano e aí você sabe. (Já que preciso ser sincero, falo logo por que demorei tanto). Sem delongas, vamos às declarações dos leitores 100% honestos, gente de diversos estados do Brasil, das mais variadas idades. Pais de família, estudantes universitários, profissionais liberais, vestibulandos, filhos – todo mundo falando nada mais que a verdade. Confira os depoimentos:
1.
“Esta matéria me fez lembrar de quando eu fazia parte de um grupo religioso radical. Na época, tinha meus 20 anos e um dos ensinamentos deste pequeno grupo era exatamente a honestidade radical.
Certa noite minha avó passou mal com problemas cardíacos e foi parar no hospital. Depois de recuperada, o médico disse que ela não podia passar raiva e nenhum tipo de estresse. No dia em que ela teve alta, meu tio entrou numa briga e tomou uma facada no peito. Foi socorrido e levado para o hospital, passou por uma cirurgia e estava em observação. A família tomou a seguinte decisão: Quando nossa avó chegar em casa, vamos dizer que o filho dela ( meu tio) viajou!
Como eu não mentia nunca… Fiquei uma semana sem conversar com minha avó. Apenas pedia sua benção e saía rápido dizendo que estava muito atarefado na faculdade!”
Bruno Da Silva Barbosa – Vila Velha, ES
Bruno Da Silva Barbosa – Vila Velha, ES
2.
“Assim que terminei de ler a matéria, aceitei o desafio de ficar duas semanas sem mentir. Não mudou nada porque eu naturalmente nunca minto. Claro que eu jamais mentiria pra vocês.”
José Aparecido Anelli Ferreira – Londrina, PR
José Aparecido Anelli Ferreira – Londrina, PR
3.
“Adoraria encarar o desafio, mas estou pensando: trabalho como operadora de caixa num supermercado e me vejo falando pro cliente: ‘Senhor, vou pedir que aguarde um instante, pois no meu sistema consta que seu nome está sujo na praça, e não posso liberar seu cheque sem a autorização do gerente. Aliás, quando eu digo ‘instante’, entenda no mínimo quinze minutos’.
Janaina Fraga
Janaina Fraga
4.
“Fui para a diretoria [da escola] só porque falei o que eu realmente achava de a professora de literatura entrar na sala de aula e falar sobre o que aconteceu com ela naquele dia, como se fôssemos psicólogos. Meus colegas brigaram comigo porque eu reclamei com o professor de química sobre o fato de ele não ter passado matéria naquela aula. Minha amiga quase me matou porque eu contei para uma colega que o nosso ‘pequeno’ grupinho ia fazer um amigo secreto separadamente do resto da sala. Revelei para uma colega que eu não via havia muitos anos que eu não gostava dela naquela época porque ela era uma ‘galinha metida’.
Resultado? Afastei-me mais ainda dos meus amigos, espantei meus colegas e meus professores, recebi mais uma bronca de minha mãe. Nem sempre sinceridade radical é uma coisa boa, se as pessoas com quem você anda não são.
Meu conselho? Se você vai mudar o seu estilo de vida, mude de amigos. Porque enquanto você se agarrar a uma parte que já foi, você não terá a chance de ser uma nova pessoa. Você vai apenas parecer mesquinho, arrogante, ignorante. Superior. O ser humano foi feito para sobreviver em comunidade. Então, pelo menos, que seja uma comunidade com a qual você se dê bem.”
Thalita Trindade – Campo Grande, MS
Thalita Trindade – Campo Grande, MS
5.
“Por estes dias, meu filho mais velho, de 7 anos, me perguntou se era verdade que não existia a fada do dente. Deixei-o falar e ele mesmo acabou por concluir que, assim como o Papai Noel não existe (há cerca de dois anos um colega da escola contou a ele e tivemos que confirmar. Dissemos que eles são fantasias e somente quando se é criança tem o poder de ver e acreditar nelas) a fada também não existe. Em resumo: não me manifestei e deixei que ele seguisse com sua própria conclusão.”
Marco Silva
Marco Silva
6.
“Há muito tempo que somente falo a verdade, sou sincera com meus sentimentos e em tudo o que faço ou não faço. Não que eu saia dizendo coisas ofensivas por aí, a gente sempre tem a opção de não dizer nada. Apenas sou bem transparente. O resultado disso? Não tenho nenhum amigo próximo, sou meio solitária.”
Telma Hanazumi – São Roque, SP
Telma Hanazumi – São Roque, SP
7.
“Resolvi fazer o teste. A verdade é que em menos de 24 horas já pensei em desistir. Se o problema da mentira é que quando você conta uma acaba tendo que contar outras, meu problema com a honestidade foi o mesmo.”
Nicole – São Paulo, SP
Nicole – São Paulo, SP
8.
“Um almoço de sábado na casa da sogrinha e do sogrão (Oh, nossa! Eu tenho de parar de dar apelidos para as pessoas de acordo com sua altura!). Pois bem, seria a primeira vez que eu passaria mais de meia hora com os membros da família do meu namorado. A primeira coisa que notei foi o pátio da frente: apesar de pequeno, bem cuidado. Bem cuidado demais. Já percebi que a mãe dele era meio afetada simplesmente porque havia flores por todo o pátio, vasos com plantas penduradas no teto da garagem, um balanço e um poodle usando um vestido e um brinco. Mme lembrei de duas coisas: sonho americano e casa da Barbie. Ou seria uma casa com gente estupidamente feliz e perfeita ou uma casa cheia de gente louca querendo pagar de perfeita.
Começamos a conversar. Papo vai, papo vem. Música. Uma breve discussão sobre o conteúdo das letras do rock e do resto. Religião. Como sou ateia e os pais dele são cristãos, um tipo de pequena guerra foi travada. Expressei todas minhas opiniões sobre cada assunto que tive com o sogrão. E isto pareceu dar uma boa impressão ao pai do meu namorado.
Enfim, todos nos sentamos à mesa. Não sei o que parecia mais gostoso: a comida ou os guardanapos de pano todos estampados.
Bem, os guardanapos com certeza eram melhores.
Não sei por quê, mas meu desafio “ser honesto comigo mesma e com os outros” não se concentrou só no que saía da minha boca, e sim com os meus atos. Eu não tenho costume de ser fina, educada, feminina ou pelo menos parecer uma pessoa e não um animal comendo.
Devo dizer que não me orgulho da minha falta de educação, mas, se for pra ser sincera, não só minhas frases mudarão.
Nisso a Senhora Eliza perguntou: “Não quer salada? Pode se servir”, com um sorriso amarelo, quase mais forçado do que o de meu namorado. Eu respondi: “Ah, eu queria, mas essa alface tá meio estranha… E o tomate tá murchinho, né?”
No fim das contas, eu não falei mais com a mãe dele. Ela me odeia. Sogrão me ama. E, bem, amorzinho está se mordendo pra não me dar umas palmadas por ter comentado sobre isso.”
9.
“Vivi durante uma semana, junto com meu amigo Gustavo Santucci, a experiência de não mentir no ambiente escolar. A experiência foi sensacional. Alguns amigos não conversavam com a gente com medo da verdade e outros abusavam dela perguntando coisas pessoais. Além disso, não fomos puxa-sacos com os professores, apenas com os que gostamos de verdade. A única coisa negativa foi a perda de uma amizade. A pessoa não aceitou a verdade (sendo sincero, fomos um pouco grossos com ela). Mas já estamos voltando a nos falar. Por isso, recomendo a todos que testem passar uma semana sem mentir!”
Matheus Mans Dametto
Matheus Mans Dametto
10.
“Tive um dia totalmente estressante, pois resolvi contar a verdade para minha mãe sobre tudo que eu havia mentido durante uns seis anos. Machuquei muitas pessoas por causa de uma mentira sobre quem eu era fisicamente [o avatar dela em redes sociais não era realmente ela]. Perdi uma pessoa que provavelmente será a única que já amei (tirando a família).”
Kácia Alinne Silva Ribeiro – Balsas-MA
Imagem: Divulgação / Dreamworks
Kácia Alinne Silva Ribeiro – Balsas-MA
Imagem: Divulgação / Dreamworks
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